No dia 9 de novembro, todo mundo nasceu Torquato Neto. Essa é a ideia por trás do primeiro filme dirigido por Elara Moretz-Sohn, “Torquato Neto em todo lugar e em lugar nenhum”, um curta-metragem que emerge de forma singular no cenário audiovisual piauiense. Mais do que um exercício de linguagem cinematográfica, o filme é resultado de um Trabalho de Conclusão de Curso em Letras – Português da UFPI, onde Elara transforma texto acadêmico em imagem, corpo e poesia, e faz algo que merece ser reconhecido. Extrair o material da academia, e colocá-lo na sociedade, para a comunidade.

Escolhendo como elenco colegas e professores do próprio meio acadêmico, costurando o roteiro com textos pouco conhecidos de Torquato e ambientando as cenas em pontos marcantes teresinenses, como o campus da Universidade Federal do Piauí, Elara constrói um filme-portal. Para quem já foi aluno da UFPI, é um retorno sensorial imediato. Para quem não foi, oferece uma janela aberta para esse território que, apesar de parecer um local erudito e concreto, abriga um universo paralelo repleto de resistências, devaneios e sentimentos. Torquato seria um Ufpiano nato!

É possível dizer que seria um “filme acadêmico”, mas o adjetivo não basta. O que Elara faz é romper com o que se espera: traz uma abordagem sensível, literária, poética e experimental. Uma mulher dirigindo um filme sobre Torquato Neto já desloca o centro da narrativa e oferece outra escuta, outro olhar. E talvez seja essa troca de perspectiva o grande trunfo do filme.

A fotografia é, em muitos momentos, marcada por uma estética teresinense triste e bonita, com marcas da fotografia publicitária local, mesclado com uma fotografia artística e expressionista. Há poesia na composição dos planos, há melancolia e memória. Há conexão em sua montagem. Os poemas e escritos de Torquato, ao serem recitados em voz alta, criam um estado de transe — e nos provocam: em que momento perdemos esse diálogo com a arte, com a inquietação, com o grito do poeta?

Elara nos coloca de frente com uma pergunta urgente em Teresina:
Onde está a poesia de Torquato em nós?
Bebemos tanto dessa fonte, nos orgulhamos dela, mas o que fizemos com esse legado? O filme também resgata a presença de uma juventude transviada, no melhor sentido torquatiano. Gente que pensa, sente e sofre como ele. Gente que ainda vive dilemas parecidos. A sensação que fica é a de que essa juventude está, mais uma vez, criando uma cena, movimentando, fazendo arte, apesar de tudo. Diria que, a partir de Elara, um novo nicho adentra ou (readentra) as produções audiovisuais, e isso que torna tudo mais belo, pois o que falta no setor cinematográfico piauiense, é agregar os diversos nichos que aqui existem.

Musicalmente, o filme te entrega o que se deseja: uma trilha sonora redescoberta (num tempo em que poucos jovens sabem de onde vieram certas pérolas da Tropicália) e acerta em todas as suas colocações. Nos teletransportando para suas poesias cantadas, dentro de inúmeras interpretações e intérpretes.
Há um destaque especial para a cena do pescador na beira do rio poti, talvez uma referência, mesmo sem saber, de produções audiovisuais piauienses já existentes com pontuações semelhantes, ‘’ cidade entre rios’’, e ‘’ rio, riso, desafio’’, ambas, criam essa mesma metalinguagem e chamado, onde rio e sol se entrelaçam como símbolos esquecidos, agora reativados no imaginário coletivo. Nos convida a entender, que se Teresina compreendesse a grandiosidade de ter dois rios e um sol pra cada um, a alegria por aqui reinaria. É cinema como rito, como provocação.

A última cena do filme é um ponto de encontro. Uma mulher que decidiu estudar — o fato e a coisa — e fez disso um gesto político e poético.E talvez, arrisco dizer, Torquato piraria — no melhor sentido da palavra — ao ver esse filme. Ao perceber que, em 2025, alguém e muitos outros, ainda buscam o movimento, o cinema, o grito. E faz isso da forma mais bela: olhando pelo começo, pela poesia.

Elara A. Moretz-Sohn, teresinense nascida e criada no pingo do mêi-dia, professora em formação, pesquisadora em literatura e, como boa piauiense, dada a ser artista. Brinca entre os palcos do teatro, as palavras e às câmeras de cinema. É assim, conversando a paixão pelo Piauí, a literatura e as tantas outras artes que surge o filme de estreia “Torquato Neto em todo lugar e em lugar nenhum” e que surgiu e surgirá tantas outras invencionices às vezes tímidas de se mostrar.

Ficha técnica do Filme:
ELARA A. MORETZ-SOHN
roteiro, direção e direção de arte
ÍCARO UTHER
direção de fotografia, operador de câmera, montagem e edição
AJOSÉ FONTINELLE
direção de elenco e assistente de produção
RAYNARA DE CASTRO
fotografia still, making of e assistente de produção
NAIRA CIBELE
som direto
GUILHERME OLIVEIRA
som direto, mixagem e desenho de som
JASMINE MALTA
orientação e produção executiva
RAFAELA LOPES
direção de arte e produção executiva
ISAAC MORETZ-SOHN
direção de arte
MARIA HELOÁ CARVALHO
direção de arte
1150 PRODUÇÕES
finalização
e l e n c o
MARIANA CORTEZ
JOSEANE MOURA PINTO
LUNE (ANA LUÍSA NUNES)
JOHN (JOÃO PAULO)
ALISSON CARVALHO
DAVI MENDES
ELARA A. MORETZ-SOHN
AJOSÉ FONTINELLE
IZABELA MOURÃO
MARCEL JULIAN
BIANCA MARIA
RUANNA SABRINA
MARIA LUIZA
FERNANDES (Mª. CLARA)
RIELLI CARVALHO
INAÊ TORRES
MARIANA MEDEIROS
LUNNA CANTALICE
MARIA LUÍSA VALLEDOR
QUIRINO NUNES
ANDREA KISS
CAROLINA DE AQUINO
TIAGO SOUZA
LARISSA RODRIGUES
PEDRO SILVA
AYRTON DE SOUZA
QUARENTA (JOSÉ FRANCISCO SILVA)
SUZANA BORGES
TAYLA SIQUEIRA
SANTOS (Mª. CLARA)
CAIO CÉSAR
RAYNARA DE CASTRO
JASMINE MALTA
RODRIGO ALVES
NAIRA CIBELE
RAFAELA LOPES
t r i l h a s o n o r a
LET’S PLAY THAT
INTÉRPRETE: JARDS MACALÉ
COMPOSIÇÃO: JARDS MACALÉ (MÚSICA) / TORQUATO NETO (LETRA)
GELEIA GERAL
INTÉPRETE: GILBERTO GIL
COMPOSIÇÃO: GILBERTO GIL E TORQUATO NETO
A COISA MAIS LINDA QUE EXISTE
INTÉRPRETE: GAL COSTA
COMPOSIÇÃO: GILBERTO GIL E TORQUATO NETO
MAMÃE CORAGEM
INTÉRPRETE: SUZANA BORGES
COMPOSIÇÃO: CAETANO VELOSO E TORQUATO NETO
PRA DIZER ADEUS
INTÉRPETE: AVA ROCHA
COMPOSIÇÃO: EDU LOBO E TORQUATO NETO
TRILHA COMPLEMENTAR:
ENVATO ELEMENTS
r e a l i z a ç ã o
1150 PRODUÇÕES
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PIAUÍ
a p o i o
COORDENAÇÃO DE LETRAS VÉRNACULAS – CLV
FLORICULTURA LI
GRAFICON
ANDRÉIA GALVÃO ADVOCACIA
LIVRARIA ENTRELIVROS
p a t r o c í n i o
INSTITUTO DOM BARRETO
EDITORA NOVA ALIANÇA
GELEIA TOTAL
a g r a d e c i m e n t o s
PALÁCIO DA MÚSICA DE TERESINA
SEU PELÉ (FRANCISCO)
RESTAURANTE FLUTUANTE
CASA DA CANOA
TIA MARISE
SÍNDICO JOSÉ CARLOS
ARQUIDIOCESE DE TERESINA